sábado, 9 de dezembro de 2017

Razão de Ser

Uma Razão de Ser em Paços de Brandão



"Lembro-me de repente de quando era criança, e via, como hoje não posso ver, a manhã raiar sobre a cidade.  

Ela então não raiava para mim, mas para a vida, porque então eu (não sendo consciente) era a vida.

A criança ficou mas emudeceu.

Vejo como via, mas por detrás dos olhos vejo-me vendo;

E só com isto se me obscurece o sol e o verde das árvores é velho  e as flores murcham antes de aparecidas.


 Sim, outrora eu era de aqui;

Hoje, a cada paisagem, nova para mim que seja, regresso estrangeiro, hóspede e peregrino da sua presentação, forasteiro do que vejo e ouço, velho de mim.


Já vi tudo, ainda o que nunca vi, nem o que nunca verei. 

No meu sangue corre até a menor das paisagens futuras, e a angústia do que terei que ver de novo é uma monotonia antecipada para mim.



Aquelas somas de fatos que, para os homens vulgares, inevitabilizariam o êxito, têm, quando me dizem respeito, um outro resultado qualquer, inesperado e adverso.



Tenho construído em passeio frases perfeitas de que depois me não lembro em casa. 
A poesia inefável dessas frases não sei se será parte do que foram, se parte de não terem nunca sido."

 (Fernando pessoa in O Livro do desassossego) 



Maofotos - Paços de Brandão 2017

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